A (pouca) água da capital
- Ronayre Nunes
- 28 de set. de 2016
- 4 min de leitura
Brasília vive momento de crise hídrica sem precedentes na história e população já sente os efeitos. Entenda um pouco mais sobre causas e soluções deste problema|
O ano de 2016 ficou marcado pela crise hídrica sem precedentes que afetou a cidade. O alerta dado no começo de setembro pela Promotoria de Defesa do Meio Ambiente e do Patrimônio Cultural (Prodema) causou preocupação pelos dados alarmantes. Com reservatórios em nível crítico, falta de chuvas e aumento exponencial do uso, a cidade corre o risco real de ficar completamente sem água.
Mesmo com as chuvas que atingiram a capital no fim de semana, a situação hídrica ainda não foi solucionada. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) lembra que chuvas mais contundentes só irão ocorrer com a chegada de outubro. Diminuição na pressão da hídrica já é feita em algumas regiões da capital e a situação pode piorar.
A promotora Marta Oliveira, da Prodema, explica que o alerta precisou acontecer, principalmente para que a população pudesse colaborar com a solução: “Decidimos dar o alerta porque a situação é extremamente grave e é necessário que mais cidadãos tenham acesso às informações que ajudam na conscientização”. Marta acrescenta que, em uma situação extrema, a cidade só teria água para pouco mais de dois meses: “No pior dos cenários podemos, na prática, passar por um racionamento brutal e ficar sem água para a produção de alimentos locais”.
Mario Diniz Neto, professor associado e diretor do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília, lembra que a população do DF, em média, convive com uma disponibilidade de água de 1,5 mil metros cúbicos por habitante por ano. Essa disponibilidade é menor do que a indicada pela Organização das Nações Unidas (ONU), que é de 5 mil metros cúbicos: “Veja que vivemos no limite inferior da disponibilidade hídrica. Mesmo assim temos que usar água para abastecimento humano, geração de energia, diluição de esgotos, irrigação, comércio e indústria”.
Em nota, a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) não abranda a crise e comunica que a população é fundamental para a resolução do problema: “A crise é grave e exige a participação da população, no sentido de fazer economia e ter um uso racional da água. Se o período de seca persistir por mais tempo, pode-se chegar a uma situação mais grave, com a adoção do racionamento”.
A crise em números
O DF é abastecido pelos reservatórios do Descoberto e Santa Maria/Torto – que juntos são responsáveis pelo abastecimento de 85% da capital. Isso além dos sistemas isolados formados por córregos e poços que são os mais difíceis de lidar em termo de captação por estarem com baixas acentuadas nos níveis hídricos. Segundo a Caesb, esses sistemas abastecem as regiões administrativas de Brazlândia, Sobradinho, Planaltina, São Sebastião e Jardim Botânico, locais afetados pela diminuição da pressão de água nos últimos dias.
Os dois reservatórios, do Descoberto e Santa Maria/Torto, estão com o menor nível hídrico da história: 49% e 37,7%, respectivamente. A Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do Distrito Federal (Adasa) já informou que, caso um dos reservatórios chegue ao nível de 20%, medidas de racionamento extremo serão tomadas.
Causas
A crise hídrica não começou do dia para a noite, muito pelo contrário. A promotora Marta Oliveira defende que a expansão desordenada do DF está entre uma das principais razões para a crise da água estar nos parâmetros atuais. Desde os mais longínquos governos, a política de Brasília tem sido vulnerável à ação de ocupação irregular e à pressão imobiliária, segundo Marta: “A especulação imobiliária atua exigindo a contínua expansão de áreas urbanas, independentes de haver capacidade de suporte para tanto”.
A promotora desabafa: “A pressão pela ocupação insustentável do território, exercida por financiamento de campanhas, troca de favores e promessas de votos, foi preponderante no sentido de levar o executivo e o legislativo a contribuírem para que se chegasse à situação atual de crise hídrica”.
A Caesb, por sua vez, defende que o período sem chuvas é altamente relevante para que a baixa dos reservatórios fomente a crise hídrica, e ainda somado a isso está o considerável aumento no consumo da água da capital. Segundo a companhia: “(A crise hídrica é) agravada por um período muito extenso de seca, um dos maiores da história do DF, conjugado a um aumento no consumo de água da ordem de 16% por pessoa, nos últimos seis anos”.
Ações
Agora que a situação chegou a um nível crítico, a única coisa a se fazer é tentar resolver o problema. A principal solução neste caso vem pelas mãos da população: com o uso controlado e consciente da água. Segundo o professor Mário Neto, a sociedade também pode se preparar para evitar momentos de extremos: “A população pode, por meio das organizações sociais, denunciar e exigir do GDF ações mais eficazes para a proteção dos recursos hídricos”.
A promotora Marta Oliveira explica que algumas ações que o governo deve seguir estão expostas na Resolução 13 da Adasa, auxiliada pelo MP. Tais ações incluem a necessidade do governo de Brasília em ouvir o Conselho de Recursos Hídricos do DF, os Comitês de Bacias Hidrográficas, assim como realizar campanhas que incentivem a população a praticar economia e o uso consciente da água.
A empresa de recursos hídricos da capital explica que também já está tomando atitudes para não deixar a crise se agravar: “Estamos fazendo campanhas para uso racional da água. Também estamos diminuindo pressão nas redes para reduzir perdas e fazendo manobras operacionais para equilibrar o sistema e não permitir que só algumas áreas, as mais altas, sejam penalizadas”.
Comments